quinta-feira, 7 de maio de 2015

OSVALDO SERRÃO NA INTIMIDADE DO QUARTO



BASTIDORES DO TRIBUNAL DO JÚRI ... HAJA ADRENALINA
São 04.33 da manhã desta gloriosa 2a feira, 04 de maio de 2015.
Estou na janela do hotel em Brasília, recebendo os eflúvios benfazejos dos primeiros raios solares, e buscando inspiração dos deuses da advocacia criminal.

Acordei cedo. Estou apreensivo. Preciso me organizar para mais um julgamento daqui a pouco, na Cidade de Taguatinga / DF.
É o 3o, a menos 10 dias. O 1o em São Paulo, e o 2o, em Belém.
Se não fosse verdadeiramente apaixonado pela minha carreira, certamente já estaria saturado a muito tempo, desse ritual: 'arruma e desarruma mala'.
Nesse ponto, aliás, nós advogados criminais somos parecidos com os cantores populares. Viajamos tanto, passamos por lugares nunca imaginados, e, paradoxalmente, não conhecemos quase nada. Sempre enclausurados nos hotéis, por segurança pessoal, face a gravidade social das causas defendidas.
Paralelamente, vivenciamos um fenômeno ainda mais dramático: a solidão e tensão prejulgamento. Poucos, aliás, já escreveram suas traumáticas experiências sobre esse enigmático e emblemático tema: 'Os bastidores do Júri'.
Quem nos vê na tribuna, não consegue imaginar o verdadeiro calvário vivido na solidão dos pensamentos.
Quase nada dormimos na véspera. As mãos amortecidas em estado letárgico, parecem dormir. O suor pelo corpo é frio. Os olhos custam a fechar, fitando o 'nada' gravado no teto do quarto. O filme de nossa vida sai, pouco a pouco, do videotape da memória. Estamos. literalmente, em 'estado de júri'.
Impressionante é que os efeitos da adrenalina que se espraiam em nosso corpo chegam a ser assustadores e apavorantes. A sensação é de se estar delirando.
Pouco importa o tempo de 'praia'. Na cabeça, como a chicotear o cérebro, sempre a grande preocupação: Como me comportarei na tribuna? Será que conseguirei convencer os jurados?
Costumo dizer que a advocacia criminal é a única profissão do mundo onde o profissional é julgado, publicamente, junto com seu constituinte. Este, pela imputação; nós, pelo que escrevemos ou falamos.
Situação ainda mais comovente ocorre nos julgamentos do tribunal do júri, onde, não raro, desconhecemos 'as surpresas' que o adversário reservou para os debates.
Além disso, discurso sempre de improviso e sem direito a revisão. Uma palavra mal colocada pode ser desastrosa, levando a perder todo um longo trabalho.
Aí começa a paciente elaboração das teses na solidão das quatro paredes do hotel. Na verdade, uma verdadeira obra artesanal.
Chego a compará-la a uma árvore de natal totalmente desnuda. Cada argumento parece um adereço que nela colocamos. 'Será que este ficou bem?'. Daí, o 'tira e põe' durante horas e horas.
Essa, enfim, é a nossa fantástica odisseia.
Por isso, nem percebi o relógio do tempo passar, lentamente, à frente do visor dos meus olhos na estrada da minha própria vida.
Completo dia 30 de junho próximo quarenta emocionantes e indescritíveis anos de carreira, e, parece que foi ontem que tudo começou.
Ainda consigo me ver, mentalmente, com passos trôpegos, envolto pela angústia e hesitação do 1o. julgamento no tribunal do júri.
Será que estou sonhando?

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