terça-feira, 29 de junho de 2010

A ESCOLA ESTÁ QUASE JOGANDO A TOALHA

A FAMÍLIA É A ÚNICA QUE PODE MUDAR A SITUAÇÃO


Jornal AMAZONIA 29/06/10
Agressores e vítima de atentado
O grupo de cinco jovens que jogou uma bomba junina em um adolescente morador de rua e o próprio adolescente vítima da violência têm o prazo de 10 dias, a contar do último domingo, 27, para comparecer à Justiça e prestar esclarecimentos. Dois dos cinco jovens que jogaram a bombinha no adolescente respondem, em liberdade, um Termo Circunstancial de Ocorrência (TCO) pelos crimes de lesão corporal e corrupção de menores. Os três adolescentes também envolvidos no caso não foram apresentados à Divisão de Atendimento ao Adolescente (Data) da Polícia Civil até o final da manhã de ontem.
A vítima, de 14 anos, estava dormindo na calçada de um estabelecimento comercial localizado na rua Aristides Lobo com a travessa Benjamim Constant quando foi atingida por uma bomba junina atirada de dentro de um carro na madrugada do último domingo. No carro estavam Filipe José Gianino Monteiro e Rodrigo Carneiro Franco e outros três menores de idade. O explosivo incendiou os jornais utilizados como cobertor pelo morador de rua, que teve ferimentos leves nos membros inferiores.
O ato de perversidade e a situação de vulnerabilidade dos moradores de rua reacendem a discussão sobre a violência urbana e lembram casos como o do índio Galdino, queimado enquanto dormia, em Brasília, em uma parada de ônibus por jovens de classe média alta, em 1997; e do morador de rua Vanderlei Pires, 35, que teve o corpo pichado com spray de tinta prateada enquanto dormia, em abril passado, no Rio Grande do Sul.
Para o cientista político e advogado Raul Navegantes, o momento é emblemático para demonstrar como "meninos tolos", como preferiu classificar o professor, agem com os seus semelhantes. "Naquele momento em que eles (jovens) estão fazendo isso, eles (moradores de rua) não são os seus semelhantes. São o que a sociedade decreta como escárnio social. Lixo que pode fazer qualquer coisa. Lixo que pode ser incinerado...", disse o professor.
Com base na avaliação do cientista político, especialista em violência urbana, a atitude dos jovens reproduz o que a sociedade já tem preconcebido como lixo social. "A sociedade os rejeitam a tal ponto, que nem como cidadãos são tratados. Os meninos mimados colocam em prática, inconscientemente, a percepção da sociedade do que é de lixo social", explicou o educador.
O professor reprovou ainda a reação do jovem de ter saído da Seccional do Comércio, onde foi feito o registro da ocorrência e a abertura do TCO, sem que a vítima tivesse recebido os cuidados médicos prometidos pelos pais dos envolvidos no crime. "Pior foi a reação do menino, que se considerou refugo. Ele foi embora e nem ligou. Foi uma reação silenciosa e emblemática de rejeição", disse o cientista político.
Sociedade vive ausência de valores e certeza da impunidade
A banalização das relações sociais e familiares, a ausência de valores e a certeza da impunidade dos infratores são apontadas pela cientista social Jane Melo como os principais geradores desse tipo de violência urbana.
A professora, que é mestra em ciência política, afirmou que atualmente há precariedade de valores, sobretudo éticos e morais, no âmbito social. "Isso releva que não há percepção dos indivíduos como cidadãos, com direitos e deveres na sociedade. Esse jovem é discriminado, desprezado e desprotegido pelo contexto social. É a completa condição de vulnerabilidade", explicou a socióloga.
Para a professora, a banalização dos valores é decorrente, em parte, da falta de imposição de limites nas relações familiares, em especial dos pais. "Com a banalização, ele (a vítima) é tratado como ninguém. Essa ausência faz com que as pessoas não percebam os outros como também cidadãos. Não percebem que eles (moradores de rua) também são fruto da sociedade e acabam segregando e excluindo", completou.
Jane chamou atenção para a necessidade de se repensar o social no sentido de inclusão da garantia de direitos dos cidadãos. Ela ressaltou ainda a importância do poder público de instigar para que os autores sejam punidos pela infração praticada contra o adolescente. "Esse moradores de rua já vivem no processo de exclusão, principalmente econômica e social, o que potencializa o desenvolvimento desse tipo de violência urbana. Com isso, gera a certeza da impunidade. É preciso que o poder público tome providências para os direitos desse jovem sejam garantidos", disse.
Durante a manhã de ontem, a reportagem voltou ao local onde o adolescente foi vítima da violência, no bairro do Reduto, mas ele não foi localizado.

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