quinta-feira, 8 de julho de 2010

ELA TIRA MEU SOSSEGO

Hacter pylori é uma espécie de bactéria que infecta o revestimento mucoso do estômago humano. Muitas úlceras pépticas, alguns tipos de gastrite e de cancro do estômago são causados pela infecção por H. pylori, apesar de a maioria dos humanos infectados nunca chegar a manifestar qualquer tipo de complicação relacionada com a bactéria.

Estas bactérias vivem exclusivamente no estômago humano e são o único organismo conhecido capaz de colonizar esse ambiente muito ácido, em parte pela sua capacidade de excretar de uma "nuvem" de amónia que as protege do ácido. As bactérias têm formato de hélice (daí o nome helicobacter) e a forma espiralada permite-lhes "atravessar" com mais facilidade a camada de muco que protege o epitélio gástrico.

História
Primeiras evidências

Em 1875, cientistas alemães encontraram bactérias espirais na mucosa gástrica - essas bactérias não cresceram em culturas in vitro e os achados foram esquecidos. Em 1892 o investigador italiano Giulio Bizzozero descreveu bactérias espiraladas colonizando o ambiente ácido do estômago de cães.

O professor Walery Jaworski da Universidade Jaguelônica, em Cracóvia, investigando sedimentos de lavagem gástrica obtidos de um humano em 1899, acabou por encontrar uma bactéria com forma espiral, que chamou de Vibrio rugula. Ele foi o primeiro a sugerir o possível papel deste organismo na patogênese de doenças gástricas. Este trabalho foi incluído no "Handbook of Gastric Diseases", mas não teve muito impacto por ter sido escrito em polonês.

DESCOBERTA DEFINITIVA

A bactéria foi redescoberta em 1979 pelo médico australiano patologista Robin Warren, que posteriormente, em 1981, em conjunto com Barry Marshall voltou a pesquisá-la; eles isolaram o microorganismo da mucosa de estômagos humanos e foram os primeiros a cultivá-lo in vitro com sucesso.Warren e Marshall afirmaram que muitas úlceras gástricas e gastrites eram causadas por esta bactéria e não por stress ou comidas picantes como tinha sido proposto anteriormente.

A comunidade médica demorou a reconhecer o papel deste microorganismo nas úlceras gástricas e gastrites, por acreditar que nenhuma bactéria pudesse sobreviver muito tempo no ambiente ácido do estômago. A comunidade médica começou a ceder após terem sido realizados outros estudos, incluindo um em que Marshall bebeu uma cultura de H. pylori, tendo de seguida desenvolvido um quadro de gastrite aguda. As bactérias causadoras da gastrite foram recuperadas a partir de biópsias do seu estômago, satisfazendo assim três dos quatro postulados de Koch. O quarto foi satisfeito pós uma segunda endoscopia feita dez dias depois da inoculação revelando sinais de gastrite e a presença da H. pylori. Marshall pôde então se tratar usando duas terapias por quatorze dias com sais de bismuto e metronidazol. Marshall e Warren demonstraram que os antibióticos são efetivos no tratamento da gastrite. Em 1994, o National Institutes of Health (EUA) publicou uma nota declarando que muitas úlceras gástricas recorrentes são causadas por H. pylori, e recomendou que os antibióticos sejam incluídos no tratamento.Acumularam-se evidencias sugerindo que as úlceras duodenais também estão associadas à infecção por H. pylori Em 2005, Warren and Marshall foram premiados com o Premio Nobel em Medicina pelos seus trabalhos com H. Pylori.

Antes do reconhecimento do papel da bactéria, as úlceras gástricas eram tipicamente tratadas por neutralização ou diminuição da produção do ácido gástrico. Quando esse tratamento era interrompido, as úlceras frequentemente reapareciam. Um tradicional medicamento contra gastrite era o subsalicilato de bismuto. Era muito efectivo, mas caiu em desuso porque seu mecanismo de acção era um mistério. Hoje em dia está muito claro que sua ação é devida ao sal bismuto, pois este age como antibiótico. Hoje, muitas úlceras gástricas são tratadas com antibióticos efetivos contra H. pylori.

A bactéria foi inicialmente nomeada Campylobacter pyloridis, posteriormente C. pylori (depois de uma correção para a gramática Latina) e em 1989, após o seqüenciamento do seu DNA e outros dados demonstraram que a bactéria não pertencia ao gênero Campylobacter, então foi colocada em seu próprio gênero, Helicobacter. Esta confusão na sua classificação acabou por atrasar as pesquisas, uma vez que Marshall não conseguia reproduzir as bactérias em laboratório pois, acreditando ser uma Campylobacter, esperava que as culturas estivessem prontas em 48 horas. Até que o acaso deu uma ajuda: num feriado prolongado, as culturas ficaram cinco dias intactas no laboratório e puderam se desenvolver, para surpresa do pesquisador..
Enquanto H. pylori permanece como a bactéria mais importante que coloniza o estômago humano, muitas outras espécies do género Helicobacter foram identificadas noutros mamíferos e em algumas aves, e algumas destas podem infectar humanos. Algumas espécies de Helicobacter foram também encontradas no fígado de certos mamíferos, estando associadas ao desenvolvimento de doenças hepáticas.

Estrutura Bacteriana Estrutura da H. pylori

H. pylori é uma bactéria gram-negativa, tem forma espiral, mede aproximadamente 3 micrómetros de comprimento e 0,5 micrómetros de diâmetro. Tem entre 4 a 6 flagelos unipolares. É microaerofilica, i.e. requer oxigénio em baixas quantidades. Contém hidrogenase que pode ser usada para obter energia através da oxidação do hidrogênio molecular (H2) que é produzido por outras bactérias intestinais.[11] Sendo teste positivo para oxidase e catalase.


Modelo molecular da ureáse de H. pylori

Com seus flagelos e forma espiral, a bactéria penetra no muco gástrico e pode ser encontrada no muco gástrico ou na superfície do células epiteliais. Produz adesinas que permitem a sua adesão quer ao muco, quer às células epiteliais. Produz a enzima urease, que converte uréia em amônia e CO2 que posteriormente é convertido a bicarbonato. A liberação da amónia é benéfica para a bactéria, já que neutraliza parcialmente o ambiente ácido do estômago. Pensa-se que a amónia, juntamente com proteínas de H. pyloricomo proteases, catalases e fosfolipases, causem danos nas células epiteliais. Uma descoberta recente é que algumas estirpes de H. pylori têm um mecanismo particular para "injectar" o agente inflamatório peptidoglicano, presente na sua própria parede celular, nas células epiteliais do estômago (veja mais adiante). Permanece desconhecido como este mecanismo é vantajoso para a bactéria.

Em certas condições de stress ambiental, Helicobacter converte-se de forma espiral em forma cocóide. A forma cocóide do microorganismo não pode ser cultivada, mas já foi encontrada no abastecimento de água no EUA, suspeitando-se que esta possa ser um meio de transmissão da bactéria. Foi descrito que as forma cocóides têm capacidade de aderir a células epiteliais gástricas "in vitro".

Infecção

A infecção pode ser sintomática ou assintomática (não apresenta os sintomas da doença). Estima-se que até 70% das infecções são assintomáticas e que aproximadamente 2/3 da população mundial são infetadas pela bactéria, tornando-se a infecção mais difundida no mundo. Taxas de infecção atuais variam de nação a nação – o ocidente (Europa Ocidental, Norte América, Australásia) apresentam taxas ao redor 25% e sendo muito mais elevado em países em desenvolvimento. Além do mais é comum, provavelmente devido ás pobres condições sanitárias, achar infecções em crianças. Nos Estados Unidos a infecção está principalmente nas gerações mais velhas (aproximadamente 50% para indivíduos acima de 60 anos comparada com 20% para indivíduos abaixo de 40 anos) e os mais pobres. Isto é principalmente atribuído a padrões de higiene mais altos e uso difundido de antibióticos. Porém, a resistência antibiótica está aparecendo em H. pylori Já existem muitas cepas resistentes a metronidazol na Europa, Estados Unidos, e está se desenvolvendo em outros países.
As bactérias têm sido isoladas de fezes, saliva e placa dentária de pacientes infectados, sugerindo vias gastro-oral e/ou fecal-oral como possíveis vias de transmissão.

Devido a incapacidade do sistema imunológico em eliminar esse microorganismo, acredita-se que na ausência de tratamento, a primeira infecção por H. pylori pode persistir por toda a vida. Porém nos idosos é provável que a infecção possa desaparecer à medida que a mucosa do estômago vai-se atrofiando e inviabilizando a infecção. A proporção de infecções agudas que persistem não é conhecida mas muitos estudos que investigaram a história natural da doença têm demonstrado aparente eliminação espontânea [14].[15]


Diagnóstico

Coloração Imunohistoquímica de H. pylori de uma biópsia gástrica.
O diagnóstico da infecção pode ser feito recorrendo a dois tipos principais de exames: os exames não-invasivos e os exames invasivos. Do primeiro tipo fazem parte o teste respiratório da ureia (do inglês "Urea breath test"), no qual o indivíduo ingere uma solução de ureia contendo carbono marcado (14C ou 13C). Se o indivíduo estiver infectado, a bactéria degrada a ureia, libertando o carbono marcado, que por sua vez é exalado, podendo assim ser detectado na respiração. Este método tem uma sensibilidade de 96 a 98%. Ainda nos exames não-invasivos, podem ser incluídos os métodos de detecção de anticorpos anti-H. pylori no sangue ou nas fezes. A detecção de de anticorpos anti-H. pylori no sangue, não significa a presença de uma infecção activa. Após terapia de erradicação, os indivíduos podem manter os anticorpos anti-H. pylori durante vários anos, mesmo não estando infectados. Deste modo, este tipo de exame não serve para avaliar a eficiência do tratamento da infecção. Neste caso, o teste mais indicado será o teste respiratório da ureia.

Os exames invasivos para diagnosticar a infecção por H. pylori, incluem a realização de uma endoscopia digestiva alta com colheita de biopsias gástricas. Nestas biopsias, podem ser realizados exames como o teste rápido da urease, a detecção histológica/imunohistoquímica da bactéria, bem como a cultura microbiana.


Tratamento


Colônia de H. pylori na superfície do epitélio regenerativo (Warthin-Starry's silver).

Em úlcera péptica de pacientes onde a infecção é descoberta, o procedimento normal é a erradicação da H. pylori para permitir a cura da úlcera. A terapia de primeira linha (do inglês "first-line") é uma terapia tripla que dura uma semana. O gastroenterologista Thomas Borody inventou a primeira terapia tripla em 1987 .Hoje a terapia tripla padrão é amoxicilina, claritromicina e um inibidor de bomba de próton como omeprazol .[18] Embora algumas vezes um inibidor de bomba de próton diferente seja utilizado, ou o metronidazol é usado no lugar de amoxicilina em alérgicos a penicilina.Esta terapia revolucionou o tratamento de úlceras gástrica, antigamente a única opção para o controle dos sintomas eram antiácidos, antagonistas de H2 ou inibidor de bomba de prótons.

Infelizmente, em um número crescente de indivíduos infetados são encontradas bactérias resistente a antibióticos. Resultando em fracasso inicial do tratamento e requer terapia com antibióticos adicionais ou estratégias alternativas. Para casos resistentes, pode ser usada uma terapia quádrupla. Compostos de Bismuto também são efetivos em combinação com as drogas anteriores. Para o tratamento de cepas de H. pylori resistentes a claritromicina o uso de levofloxacina como parte da terapia tem sido recomendado.

Há algumas evidências preliminares que o consumo regular de brotos brócolos poderiam erradicar H. pylori.

Um estudo feito em Esquilo da Mongólia indica que o extrato de chá verde pode suprimir o crescimento de H. pylori. Um outro estudo feito na Coreia do Sul sugere que um polissacarídeo ácido encontrado no chá verde é significativamente efetivo na prevenção da adesão do H. pylori a células epiteliais humanas em cultura.
Como explicado abaixo, alguns autores sugeriram que algumas cepas de H. pylori podem ser protetores contra certas doenças cardíacas e esofágicas. Portanto, uma aproximação mais prudente da erradicação completa pode ser necessária em alguns casos.

Associação com câncer gástrico

O câncer gástrico e o linfoma MALT (linfoma da mucosa associada ao tecido linfóide) foi associado com H. pylori, e a bactéria foi categorizada como um carcinógeno grupo I pela Agência Internacional para Pesquisa em Câncer (IARC em inglês). Embora esta associação é razoavelmente forte, não esta completamente claro se há uma relação causal envolvida.

Dois mecanismos relacionados pelo qual a H. pylori poderiam promover câncer estão sob investigação. Um mecanismo envolve o aumento da produção de radical livres aumentando a taxa de mutação nas células do hospedeiro. O outro mecanismo proposto foi chamado "via perigenética" e envolve o aumento da transformação do fenótipo das células do hospedeiro por meio de alterações nas proteínas celulares como proteínas de adesão. Foi proposto que a H. pylori induz inflamação e altos níveis locais de TNF-alfa e/ou interleucina 6. De acordo com o mecanismo de perigenético proposto, moléculas de sinalização associadas à inflamação como TNF-alfa podem alterar adesão as células epiteliais gástricas e levar à dispersão e migração de células epiteliais transformadas sem a necessidade de mutações adicionais nos genes supressores de tumor como genes que codificam proteínas para adesão celular.

Refluxo ácido e câncer esofágico

As taxas de infecção por H. pylori têm diminuído em países em desenvolvimento, presumivelmente por causa da melhora das condições de higiene e aumento do uso de antibióticos. Portanto, a incidência de câncer gástrico no EUA diminuiu 80% no intervalo de 1900 a 2000. Porém, doença de refluxo gastroesofágico e câncer esofágico aumentou dramaticamente durante o mesmo período. Em 1996, Martin J. Blaser postulou a teoria que H. pylori também poderiam ter um efeito benéfico, regulando a acidez do conteúdo estomacal, diminuindo o impacto de regurgitação de ácido gástrico no esôfago. Enquanto alguma evidência favorável foram acumuladas, a partir de 2005 a teoria não é mais aceitada universalmente.
Estudo genômico


M.E. fotografia da H. pylori

Actualmente, o genoma de várias estirpes de H. pylori foi completamente seqüenciado. As primeiras estirpes a terem o seu genoma sequenciado foram a 26695 e a J99 O genoma da estirpe 26695 consiste em aproximadamente 1.7 milhão de pares de bases, com cerca de 1550 genes. As estirpes 26695 e J99 mostram diferenças genéticas, com até 6% de diferença nos nucleotídes.

O estudo do genoma de H. pylori é centrado na tentativa de compreender a patogênese, a habilidade deste organismo para causar doença. Há 62 genes na categoria "patogênese" no banco de dados do genoma. As estirpes seqüenciadas têm Cag (ilha de patogenicidade) longas de aproximadamente 40 kb (uma sucessão de genes que se acredita ser responsável pela patogênese) contendo mais de 40 genes. Esta ilha de patogenicidade está normalmente ausente em estirpes de H. pylori isoladas de indivíduos assintomáticos.

O gene cagA de H. pylori codifica uma proteína considerada um factor de virulência. Estirpes bacterianas que têm o gene cagA estão associadas com uma maior capacidade de causar úlcera péptica. Este gene codifica uma proteína relativamente longa (1186 aminoácido). A proteína do cagA é transportada as células humanas onde pode romper o funcionando normal do citoesqueleto. A ilha de patogenicidade Cag tem aproximadamente 30 genes que codificam um complexo de transporte, o sistema de secreção tipo IV. Apos anexação da H. pylori a células epiteliais do estômago, a proteína cagA é injetada nas células epiteliais pelo "sistema de secreção tipo IV". A proteína cagA é fosforilada em resíduos específicos de tirosina por uma tirosina cinase associada a membrana das células do hospedeiro. Cepas patogênicas de H. pylori foram demonstradas ativando os receptores de fator de crescimento epidérmico (EGFR em inglês), uma proteína de membrana com um domínio tirosina cinase. A ativação do EGFR pela H. pylori são associados com a transdução de sinais e expressão gênica alteradas nas células epiteliais do hospedeiro que podem contribuir para a patogênese. Também foi sugerido que uma região c-terminal da proteína cagA (aminoácidos 873-1002) poderia regular a transcrição de genes da célula do hospedeiro independente de sua fosforilação . Acredita-se, devido a baixa quantidade relativa de GC comparado com o resto do genoma da helicobacter, que o gene cagA+ foi adquirido através de transferência horizontal de outras espécies bacterianas.
Cada população humana tem uma distribuição característica das cepas de H. pylori que tipicamente infetam os membros daquela população. Isto permite aos pesquisadores usar a H. pylori para estudar padrões de migração humana. Poderia ser estabelecido que H. pylori em Índios Amazônicos tem origem do leste asiático ao invés de européias, sugerindo que os imigrantes originais chegaram a pelo menos 11,000 anos atrás.

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