quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

MANIFESTAÇÃO OU DESORDEM

CRÉDITO HELDER BARBALHO

O cinegrafista Santiago Ilídio Andrade, de 49 anos, foi atingido mortalmente na cabeça quando cobria, para a TV Bandeirantes, uma manifestação pública no início da noite de quinta-feira, 10 de fevereiro, no centro do Rio de Janeiro. Na segunda-feira, apenas quatro dias depois, ele morreu no hospital para onde fora transferido. A gravidade do ferimento, já sabiam os médicos que o atenderam desde o primeiro momento, não lhe oferecia a mínima possibilidade de sobrevivência.

A manifestação, fatal para ele, tinha como objetivo protestar contra o aumento das tarifas de ônibus. Uma causa legítima, portanto. O ato perdeu legitimidade quando descambou para a violência e o ataque letal a um trabalhador. A violência, seja de quem for – manifestante ou policial –, não pode triunfar sobre a razão e o bom senso. As demandas não se legitimam pela força, mas pelo convencimento, pela persuasão. O diálogo é o melhor – e eu diria o único – instrumento verdadeiramente efetivo para a solução de conflitos.
Como explicar, então, o ataque brutal de que foi vítima o cinegrafista e que o levou à morte?
Sobre isso, convém fazer uma reflexão. Todos nós, sem distinção, precisamos parar um pouco. Para pensar e refletir. Precisamos pensar sobre que tipo de sociedade queremos construir. E em que cidade, em que Estado e em que país queremos viver. Nós, sim, mas também os nossos filhos e netos. As futuras gerações.
Desde meados do ano passado, passou a ser uma constante, no Brasil, a presença de manifestantes nas ruas das cidades brasileiras. Os protestos populares se multiplicam por todos os lugares, pelas causas nobres de cobrar “padrão Fifa” para os serviços públicos. Bloqueios de ruas, de avenidas, de estradas, se tornaram corriqueiros. É preciso buscar um ponto de equilíbrio entre as pressões da sociedade e a capacidade de resposta do poder público. As pessoas que bloqueiam ruas e estradas devem ter consciência de que, ao exercer um direito em causa própria, estão ao mesmo tempo ferindo direitos de terceiros, impedindo-os de ir e vir, de circular, de se locomover, de alcançar seus destinos.
No Rio, em São Paulo e em Brasília, principalmente, essas manifestações têm assumido um caráter ainda mais grave. Lá, claramente, se busca o confronto. A violência tem se revelado um método comum de ação. Já se tornaram rotineiros os conflitos de rua entre manifestantes e as forças policiais.
É preciso que fique claro. O direito de expressão e de livre manifestação é uma conquista da democracia, é um bem social consagrado pela própria Constituição. Mas esse direito não pode ser desvirtuado por atos de violência, anarquia, intolerância e desordem.
Quem vai encapuzado a uma manifestação, levando armas e explosivos, como o que matou o cinegrafista Santiago Andrade, claramente não está bem intencionado e não está exercendo um direito. Antes, está agredindo direitos alheios e desafiando as leis. São criminosos, portanto.
A população brasileira já conviveu com manifestações de rua verdadeiramente gloriosas, pelo nível de participação popular e pelo significado. Como exemplo, podemos citar a marcha pelas Diretas Já, gigantescas mobilizações que em 1984 inundaram as ruas de todas as capitais brasileiras – Belém, inclusive – e que ajudaram a precipitar o fim do regime militar. Também foi notável o movimento estudantil dos “caras pintadas”, que em 1992 foram às ruas para exigir o impeachment do então presidente Collor.
Nessas manifestações de caráter cívico, o Brasil fortaleceu a democracia. Quando, porém, as manifestações de rua fomentam a violência, a intolerância e o ódio, ferindo e matando pessoas, aí elas fragilizam as instituições e põem em risco os fundamentos democráticos.
Esse é um risco que precisamos evitar.

(*) Presidente da FAMEP-Federação das Associações de Municípios do Estado do Pará.

helderbarbalho@hotmail.com

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