domingo, 19 de junho de 2011

OLHA QUEM ESTÁ A FAVOR DA DIVISÃO DO ESTADO FAZEM

Faz sete anos que ninguém fala mais nesse crime. A não ser, é claro, a família da vítima. O pistoleiro e os mandantes estão livres, leves e soltos. O processo não anda. O Ministério Público e o Judiciário simplesmente não têm o que dizer sobre este caso. No dia 3 de julho de 2004, por volta das 10h30, dois homens saltam de uma motocicleta e cumprem um enredo traçado meses antes por homens poderosos do oeste do Pará, acusados de grilagem de terras, tráfico de drogas, crimes contra pessoas e contra a floresta amazônica.

Não havia a menor chance de defesa para o ambientalista, pequeno produtor rural e militante da Pastoral da Juventude da Comissão Pastoral da Terra (CPT) Adilson Prestes, 33 anos, o alvo dos pistoleiros. Chamado pelo jornal “O Globo” de o “novo Chico Mendes da Amazônia”, Prestes foi morto com seis tiros à queima-roupa na frente de sua casa.

Um terceiro homem, ligado ao esquema da execução, observa alguns metros adiante os dois motoqueiros sumirem rapidamente pelas ruas de terra batida da cidade de Novo Progresso. Preço da morte: R$ 70 mil. Apenas R$ 10 mil teriam sido pagos.

Prestes era um homem marcado para morrer e sabia disso. Não recuou um palmo. Pelo contrário: esteve por três vezes em Belém, entregando dossiês às autoridades da Secretaria de Segurança Pública, do Ministério Público e do Poder Judiciário. Deu nomes, endereços, telefones e CPF dos envolvidos. Em sua lista, além de fazendeiros e madeireiros, havia políticos e policiais militares graduados de Santarém, Itaituba e Moraes de Almeida, assim como um delegado e investigadores da Polícia Civil.

Em qualquer país sério, as denúncias feitas pelo corajoso Prestes seriam investigadas a fundo. Fosse para confirmá-las e tomar as providências cabíveis para proteger o interesse público e as pessoas ameaçadas da fúria dos predadores da floresta, ou para declará-las improcedentes e enquadrar o denunciante por falsa comunicação de crime. Nada foi feito até agora. Com muita má vontade, alguns policiais limitam-se a dizer que Prestes ‘falava mal de todo mundo’, como se isso justificasse ter sido abatido a tiros.

MARCADA

Um fato novo em mais este caso de omissão das autoridades: na sexta-feira, apareceu em Novo Progresso uma comissão ligada aos direitos humanos da presidência da república.

O objetivo era ouvir dona Ivanilde Prestes, irmã de Adilson. Ela está na lista de marcados para morrer porque não se conforma com a impunidade que protege os criminosos que mataram o irmão dela.

Ivanilde perdeu a saúde e a paz. Vive enclausurada e deprimida. Já os assassinos e mandantes desfilam sorridentes pelas ruas de Novo Progresso. Derrubam a floresta, enchem os bolsos de dinheiro e compram o silêncio dos que lhes criam problemas.

Repórter temeu virar personagem

O repórter Paulo Jordão, que investigou as chacinas impunes no Estado, contou ao DIÁRIO que teve medo, ao viajar pelo sul do Pará, de se transformar em personagem das matérias que escreveu sobre o caso. Seu depoimento:

"O Tribunal de Justiça do Estado (TJE) designou os jornalistas Carlos Mendes e eu, Paulo Jordão, para checarmos a situação de vários processos sobre chacinas contra camponeses, ocorridas há vários anos no sul e sudeste do Estado. Nós dois tínhamos, como temos, experiência neste tipo de matéria, pois, além de trabalharmos por vários anos como repórteres nos jornais de Belém, trabalhamos como correspondentes, ele do 'Estadão' e eu de 'O Globo'.

Todas as informações apuradas por mim eram enviadas para o Mendes, que organizava, checava e editava o material. Uma vez na estrada, era eu e Deus, já que o sul e o sudeste do Pará são imensos e a minha presença não era bem-vinda na região, afinal, estava mexendo em feridas que teimavam em não cicatrizar.

Além do mais, os poderosos da região não tinham interesse que a Justiça reabrisse processos envolvendo madeireiros e fazendeiros de lá, gente de muito dinheiro, influente, a maioria de outros estados. Mas eu tinha que fazer meu trabalho e corri estrada em busca dos processos em que a grande maioria dos mandantes e executores das mortes estava impune. Encontrei todos os processos, alguns arquivados, outros paralisados e um que sumiu, sobre uma chacina em Goianésia do Pará.

Corri perigo e por várias vezes tive de sair às pressas das cidades onde estava hospedado com medo de ter o mesmo fim dos personagens das minhas matérias. Um momento em que vivi grande tensão foi em Xinguara, quando entrevistava um homem poderoso na região, dono de um cartório e de terras, que, ao mesmo tempo em que atuava como escrivão criminal do fórum local, aparecia como advogado de pistoleiros.

Durante a entrevista, o meu alerta de perigo acendeu, senti que a fisionomia do entrevistado mudava a cada pergunta, então decidi parar de perguntar. E em seguida, sumi da cidade. Outra entrevista que marcou o meu trabalho foi com o senhor Artur Barbosa Dias, de idade bem avançada, que era pai do jovem lavrador Julimar Barbosa Lima, de 18 anos.

Amargurado e morando de favor na casa de uma filha, em Xinguara, ele perdeu tudo o que tinha depois que o filho foi morto. O detalhe macabro: os pistoleiros que mataram Julimar cortaram a orelha dele e levaram como troféu.

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