domingo, 27 de janeiro de 2013

PEDRAL DE SÃO LOURENÇO E O PARÁ

Trinta anos de luta pela construção das eclusas de Tucuruí não foram suficientes para que os paraenses conseguissem a tão sonhada integração por meio da hidrovia Araguaia-Tocantins, fundamental para o projeto de desenvolvimento de uma das regiões mais ricas em recursos minerais do País. O desafio agora atende pelo nome de Pedral de São Lourenço, um conjunto de rochas que precisa passar por derrocamento para garantir à plena navegabilidade o trecho próximo às eclusas.

A obra chegou a ser incluída no Programa de Aceleração do Crescimento, mas para surpresa geral, foi retirada sem explicações. O assunto foi alvo de correspondência enviada, pelo senador Jader Barbalho (PMDB), no início do ano passado, à presidente Dilma Rousseff. Jader também formalizou pedido de informações ao Ministério do Planejamento. A resposta de Miram Belchior: a obra será alvo de novos estudos, o que pode adiar indefinidamente um dos projetos mais importantes para a economia do Pará e do Brasil.

“Sem a obra de retirada das rochas do Pedral de São Lourenço, não há navegabilidade para os comboios, cuja tonelagem não consegue ultrapassar, no período seco do rio, entre agosto e janeiro, o trecho de 35 quilômetros, quando somente pequenas embarcações podem navegar no local”, explicou Jader Barbalho na carta enviada à presidente.

O senador diz que nos últimos meses fez uma espécie de cruzada para alertar as autoridades e empresários do Estado e pedir a união em torno da causa que, afirma ele, deve ser suprapartidária. O resultado decepcionou. “Talvez não tenham percebido a gravidade do problema”, avaliou nessa entrevista, onde defende a criação de um movimento em defesa da hidrovia, crucial para viabilizar a produção de aços laminados no sul do Pará. Veja a conversa com os repórteres Luiz Flávio e Rita Soares:

P: O senhor já tem quase 50 anos de vida pública. Quantas vezes defendeu a viabilidade da hidrovia Araguia-Tocantins?

R: Existe uma especulação histórica de que a hidrovia do Araguaia-Tocantins era estudada desde a época que o Marquês de Pombal era Primeiro Ministro de Portugal, um projeto sonhado de unir a Bacia do Prata no extremo Sul da Argentina e Uruguai com a Foz do Amazonas. Lamentavelmente os governos no Brasil nunca deram a importância para a navegabilidade dos rios. Não precisa ser um especialista para entender que o transporte fluvial é um dos mais baratos e a nossa bacia fluvial brasileira é fantástica, especialmente a do Amazonas. Mas até agora não existe uma política de transporte fluvial para a nossa região. Ouço falar desse projeto há muito tempo. Seria um projeto para 2,2 mil quilômetros de extensão. Seria maior que a Belém-Brasília. Há muito tempo foi elaborado um projeto financiado pelo Banco Mundial chamado Projeto de Desenvolvimento e Integração do Araguaia e Tocantins (Prodiati), que previa o desenvolvimento de todo o centro-oeste brasileiro, abrangendo o antigo estado de Goiás, hoje Tocantins, parte do Maranhão e o Pará. E a hidrovia seria a depositária de todas as pequenas vias e rodovias originárias, levando toda a produção e passageiros desses Estados. Um porto seria construído a cem quilômetros de Brasília. Com o tempo, se materializou a hidrelétrica de Tucuruí no Pará, que originalmente não previa fechar o rio Tocantins, mas sim transformá-lo numa via de transporte e de integração econômica. Só que a hidrelétrica foi construída na época da ditadura militar, vedando o transporte fluvial na região. O valor da eclusa seria muito menor se tudo tivesse feito junto, mas priorizaram a questão energética e deixaram tamponado o rio Tocantins.



P: Então começou a luta das classes política e produtiva para corrigir esse erro...

R: O projeto das eclusas foi desprezado a partir da hidrelétrica de Tucuruí, se deslocando o projeto para o Ministério dos Transportes, e nenhuma providência foi tomada desde então. Começou a luta de toda uma geração, que durou mais de 30 anos. Cheguei a entregar a diversos presidentes da República estudos referentes à hidrovia e sua importância para a nossa região e para o país, e um dos pioneiros nesses estudos foi o professor Nelson Ribeiro. Cheguei a entregar ao então Ministro Eliezer Batista, ex-presidente da Vale e ex-Ministro de Infra-Estrutura do presidente Collor um projeto que mostrava a importância dessa hidrovia para a integração nacional, deixando de lado essa história que a hidrovia era importante apenas para o Pará. O projeto uniria todo o estuário do Prata com a Foz do Amazonas, passando pelo centro do Brasil. Lamentavelmente não conseguimos sensibilizar o governo.



P: E como, de fato, as eclusas foram viabilizadas após mais de três décadas?

R: Na minha última passagem pelo Senado e pela Câmara Federal comecei minha luta pela viabilização da Eclusas de Tucuruí. Consegui convencer o presidente Lula de que era fundamental deslocar o projeto da cabeça de burro dos Ministérios dos Transportes, onde a obra estava parada, para a Eletronorte, vinculada ao Ministério das Minas e Energia, que na época era dirigida pelo paraense Carlos Nascimento, unindo assim recursos da União com a da estatal. Conseguimos que a obra fosse delegada para a Eletronorte e foi dessa forma que, depois de 30 anos, foram viabilizadas as Eclusas de Tucuruí.



P: Concluíram-se as eclusas com muita festa em Tucuruí. A história acabou?

R: Não. No rio existem corredeiras que em parte do ano, quando o rio baixa, impedem a navegabilidade, surgindo o Pedral do Lourenço, que precisa ser derrocado para garantir a passagem, sem obstáculos. Esse projeto está diretamente ligado a outro estratégico, lançado no governo Lula, que é a criação da Aços Laminados do Pará (Alpa) em Marabá. Será a primeira siderúrgica do Estado e fará com que acabe a nossa condição de mero exportador de minério de ferro para Itaqui e passemos a fabricar aqui chapas de aço, primeira etapa de industrialização com valor agregado, gerando emprego e receita para o Estado.



P: A derrocagem do Pedral do Lourenço será um desafio como as eclusas, demorando mais de 30 anos para sair?

R: O pior de tudo é que essa obra foi incluída no PAC no governo Lula, em 2011, considerada como obra prioritária para o governo federal. Sem essa obra não há como haver siderúrgica, pois não há como transportar a produção. Se a hidrovia sair, o escoamento dessas placas de aço se daria pelo porto de Vila do Conde, em Barcarena. Tanto que o projeto da derrocagem está ligada à ampliação do porto de Barcarena. O que me assustou foi a retirada abrupta e inexplicável desse projeto do PAC. Fiz então uma carta à presidenta Dilma Rousseff estranhando a medida e em seguida formalizei pelo Senado um pedido de informações ao Ministério do Planejamento sobre o fato. A ministra Miriam Belchior respondeu que o governo estava formando um grupo de estudo para rediscutir a derrocagem e a ampliação do porto de Barcarena. Mas discutir o quê? O projeto já não havia sido incluído no PAC ? Senti que estávamos sendo lesados, já que a decisão inviabilizava um dos projetos mais importantes para nosso Estado e para o Brasil. As eclusas foram construídas para dar navegabilidade ao rio Tocantins. Sem a derrocagem, viram um grande elefante branco. Paralelamente a isso os cearenses estão concluindo a sua siderúrgica no Ceará sem produzirem um quilo de ferro sequer. Ou seja, o ferro que será industrializado lá fatalmente será de Carajás, sendo em seguida exportado pelo porto de Pedem.



P: O momento parece ser bem delicado. O que fazer a para que esse cenário não se torne realidade?

R: Mais do que nunca há a necessidade de uma grande mobilização aqui envolvendo todos os setores da nossa sociedade. Não vamos crescer nunca se continuarmos a exportar o minério in natura através do porto de Itaqui, no Maranhão. A sociedade precisa ser alertada sobre isso. A ministra do Planejamento anunciou essa semana que o governo federal finalmente assumiria a obra da derrocagem. Entretanto devemos ficar atentos mais do que nunca, já que essa obra, lembro mais uma vez, foi retirada do PAC, obra essa que foi anunciada quando da inauguração das eclusas e do anúncio da Alpa. Temos que fazer um verdadeiro mutirão e não largarmos o pelo dessa gente. Vejo agora muitos querendo se apresentar como o pai da criança... Eu não sou e nem quero ser o pai de nada. Apenas registro esses dados históricos e reivindico que cobrei a obra da Presidente da República e da Ministra do Planejamento, e de posse das respostas repassei a autoridades e lideranças empresariais do nosso Estado. Isso foi há um ano. E vejo agora surgindo o assunto na mídia como se fosse uma coisa nova. Temos que exigir da presidente Dilma que a derrocagem do Pedral do Lourenço retorne ao PAC e nos unir de fato, deixando de nos contentar com ações espasmódicas que depois caem no esquecimento. Os investimentos feitos no Pará são menores que os de uma linha de onze quilômetros que o governo federal está financiando dentro da cidade de São Paulo.



P: Essa é uma questão federativa e o PMDB integra a base do governo Dilma, inclusive com o cargo de vice-presidente. Cada Estado possui seus interesses. De que forma o Pará deve ser organizar nessa luta?

R: Para que essa luta ganhe maior credibilidade ela precisa ser apartidária. Trazer uma siderúrgica para cá, tornar a hidrovia navegável, ampliar o porto de Barcarena e viabilizar a ferrovia Norte-Sul são lutas de todos os paraenses. O nosso partido nesse momento é o Pará e todos os partidários e apartidários devem se engajar nessa luta, estando ou não no poder público. O que não podemos é continuar a assistir a postura colonizadora que se aplica ao Pará. É uma luta que extrapola o âmbito partidário. Esse é um projeto de desenvolvimento que interessa à atual geração e às futuras gerações e implica na melhoria da qualidade de vida da nossa população. Somos a maior província mineral e energética do Brasil e damos um contribuição fantástica ao saldo da balança comercial deste país. Mais do que nunca devemos ficar alertas. Devemos reunir, traçar uma agenda e elaborar estratégias de luta para não vermos o bonde passar mais uma vez.



P: Falando um pouco mais de política local, como andam as negociações para a eleição da Mesa Diretora da Assembleia Legislativa do Estado?

R: A bancada do PMDB reuniu durante um almoço no final do ano passado e foi lançado, por unanimidade, o nome do deputado Martinho Carmona para a disputa. Todos os deputados da bancada deram conta da viabilidade da candidatura e essa questão está a cargo das lideranças na Assembleia, do PMDB com as demais bancadas. O que fiz como presidente do partido foi constatar que ele reivindicava o direito da candidatura própria com o apoio de outros partidos.



P: Esse é um sinal que a aliança do PMDB e do PSDB está esgarçada?

R: Absolutamente! Não considero que atinja essa dimensão. Se alguém imagina que uma questão interna desse tipo deve ser vista com essa lente de aumento, eu lamento. A bancada do PMDB tem todo o direito de oferecer um nome e angariar apoios, assim como outras bancadas. Sou solidário à bancada do meu partido, que é o partido mais antigo do Brasil. Muitos nasceram depois de nós, muitos derivaram de nós e muitos ganharam espaço na política do Pará e ocupam funções por nossa causa. O PMDB não precisa pedir licença para fazer política. Pelo menos enquanto eu for presidente da legenda aqui.

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